Hospitalidade e Fair-Play
O programa social, com o Marítimo a interpretar a ancestral hospitalidade madeirense, maravilha a caravana do Benfica. Mas a vertente desportiva é a mais importante. Os resultados alcançados pelo Marítimo enchem de orgulho a generalidade dos madeirenses. Vencer o clube mais popular da capital do país era um feito notável. E sobre ele dois registos devem ser destacados. O primeiro para reconhecer a superioridade futebolística da formação lisboeta. O Benfica apresenta no Funchal um futebol mais amadurecido, feito de passes juntos ao terreno de jogo, a que os madeirenses não estavam habituados. Vencer este tipo de jogo exigiu a mais profunda das aplicações e só esteve, entre os madeirenses, ao alcance do Marítimo. O outro registo tem a ver com a pretensa imposição de resultados positivos para o Marítimo por processos além das regras do jogo. Já tal assunto – foi abordado a propósito da constituição da Associação de Futebol do Funchal –, em 1916, e da conquista dos dois primeiros campeonatos oficiais. Agora, deixemos falar Ribeiro dos Reis, através de um extracto das ‘Notas de Viagem’, publicadas no ‘Sport de Lisboa’, a propósito dos jogos com o Marítimo:
"Registamos com prazer a grande correcção e lealdade com que os desafios foram jogados por ambos os grupos. Os nossos adversários, se bem que mais fortes fisicamente que todos nós, não recorreram a violências, desmentindo assim as informações que até nós tinham chegado".
Terceira Visita a Lisboa
Em Outubro deste ano de 1922, o Marítimo desloca-se a Lisboa, a convite do Benfica. As expectativas geradas na Páscoa não se traduzem em resultados positivos nos campos lisboetas. Mas esses resultados vão realçar mais as circunstâncias adversas de organização da equipa e as dificuldades dos primeiros momentos de adaptação aos campos da capital que a diferença de potencial entre o futebol dos verderubros e a reconhecida capacidade futebolística dos lisboetas. Impossibilitado de utilizar alguns dos seus jogadores habituais, inadaptado a campos de dimensões superiores às do Almirante Reis e com pisos diferentes, o Marítimo acusa ainda um ambiente que lhe é de todo estranho, acabando por ficar aquém do que pode e sabe fazer em termos futebolísticos. Nos dois jogos com o Benfica acontecem duas derrotas (1-4 e 0-2); num encontro com o Sporting, nova derrota (2-4), embora neste caso se registem legítimas queixas sobre a arbitragem; um ‘Misto’ lisboeta volta a derrotar os madeirenses (3-4). A vitória sobre o casa Pia (6-3) é o único resultado positivo na capital.
(As)Salto ao Porto
Ainda em Lisboa, o Marítimo é contactado pelo Futebol Clube do Porto para se deslocar à Cidade Invicta. Era um convite honroso, que só se pode compreender pelo facto da fama de que dispõe se sobrepor aos resultados menos positivos alcançados na capital. E o que fora um mero convite transformar-se-ia num ‘assalto’ ... O F.C. Porto detinha o título de Campeão de Portugal, correspondente à época 1921/22, na qual a prova se realizou pela primeira vez e à qual o campeão da Madeira não tivera acesso. Mas, mesmo jogando no seu terreno e com o apoio dos seus apaniguados, o Porto foi derrotado pelo Marítimo (3-1). E na segunda partida, que os portistas pretendiam de desforra, registou- se um empate a zeros. Estes resultados permitem, em contraponto à ‘desilusão’ advinda dos jogos disputados na capital, retomar convictamente a ideia de que o Marítimo poderia, de facto, ombrear com as melhores equipas continentais.
Na Rota do Tenerife
Em Dezembro deste ano de 1922, comemora-se o V Centenário da Descoberta da Madeira. Entre o grupo de tenerifenhos que assiste aos eventos no Funchal está a equipa de futebol do Club Deportivo Tenerife, à data tido como a melhor formação das Ilhas Canárias. Logicamente, essa presença motiva a organização de três jogos ‘insulares’. O Marítimo vence a formação espanhola por 1-0, depois dela ter derrotado o Nacional (2-0) e antes de ter sofrido nova derrota face a um ‘Misto’ (2-0). Esta vitória maritimista motivou o convite para a deslocação do clube a Tenerife, em Maio do ano seguinte, por ocasião das festas locais. Nesta digressão o clube vai disputar três partidas. O Marítimo vence a primeira (3-2) e empata as duas seguintes (1-1 e 0-0). Um ‘pormenor’: ao mesmo tempo, na Madeira, disputava- se a Taça António Costa; a equipa de Honra cumpre os dois primeiros jogos da prova (Madeira e União) e deixa à ‘segunda categoria’ a responsabilidade de enfrentar Nacional, Império e Internacional. Foram alcançadas três vitórias, suficientes para garantir o primeiro lugar ... Da deslocação a Tenerife, o La Prensa fez o seguinte registo:
"Pela primeira vez na nossa vida desportiva presenciámos ontem uma partida de intensa emoção, de incomparável técnica de jogo, elegância e beleza nas jogadas: Marítimo-Tenerife. Assim ganhou o Marítimo com o seu jogo maravilhoso tecnicamente falando (...)"
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